terça-feira, 8 de abril de 2014

“O regresso a casa” Harold Pinter, no D Maria II

“O regresso a casa” Harold Pinter, no D Maria II

A acção inicia-se com o regresso a casa de Teddi (Ruben Gomes)   em visita aos  dois irmãos e  ao pai Max, pensionista pobre    (João Perry) visita de apresentação da sua mulher Ruth , mãe dos seus três filhos.

Até aqui temos a banalidade.


O irmão  de Teddi, Joey é um  pugilista modesto ( João Mamede) o outro irmão é agenciador de pequenos negócios, tais como a prostituição  de bairro.  O irmão de Max, o pai, é motorista de táxi  (Jorge Silva Melo) alminha que morre subitamente, sem provocar , tal facto, nenhum sentimento.

Aqui começa o distúrbio.

Se as personagens são  pobres em  recursos financeiros, já a casa  da família onde tudo se desenrola é indiferente, não é pobre, não é rica. Esta foi a escolha do encenador.

Tudo começa com um diálogo  infra- matinal, entre o pai Max e o filho agenciador, ambos sentados na sala, de manhã.

No diálogo não parece haver  intenção de agredir, nem do pai, nem do filho, mais parecendo  a conversa uma altercação  doméstica e pateta.

Joao Perry opta por um dicção arrastada, quase demente, entre-cortada por picos de voz  estremecida, emocionados , sem que o texto o justifique, picos muito rápidos, enfatizando, talvez, o absurdo que  adivinha.

Esta composição da personagem por Perry não nos parece feliz, já  que seria expectável alguma sacralidade dramática nos dizeres do pai, dono da casa, chefe do clã,  muito irritado com as ninharias matinais  do costume, mas mesmo assim o pai.

Elementos fora do ambiente:

Teddi faz a diferença, com o seu fato impecável e perfil  discreto, homem de poucas falas que  fala pouco, por sinal.

Ao despir e ao vestir o seu sobretudo branco de um comprimento e sumptuosidade notáveis, mais parecia  aquele sobretudo  um paramento.

Este filho Teddi, professor universitário nos EUA, doutorado em Filosofia, introduz o elemento de  diferença de classe social nesta família: a grande tensão, que se aproxima, fica assinalada.

 Porém, nenhum tema  da filosofia do dia a dia  é da  especialidade de Teddi, não respondendo, por isso ao irmão agenciador  de prostitutas, que formula perguntas muito bem estruturadas, todas sem resposta...

Será a mulher deste irmão Teddi que  resolve não partir com o marido para junto dos três filhos , nos EUA, ficando na casa da família, em Londres.

A mulher irá, pelo menos assim decide, depois da partida do marido, dedicar-se à prostituição, em benefício  da família do marido, pai e irmãos.

Este projecto surge do nada, na vida do casal visitante, mas no decurso da peça vamos perceber que não levanta qualquer tipo de conflito.

Na perspectiva da cultura ocidental tradicional, em que a pobre da Eva depois de seduzida pela serpente, se dedica, em exclusivo, a Adão  e aos benefícios do lar cristão, que corresponde à continuação do Jardim do Eden, esta  súbita e inesperada destinação de Ruth  ao Mal - saltamos do reino de Deus para o reino da serpente e do animais rastejantes -  escolha aparentemente desmotivada, deixa o espectador  incrédulo, o que ficou bem  expresso nos fracos aplausos, no D, Maria ll, espectadores  onde eu me incluía.

Sendo a peça de 1963, é de acreditar que Pinter tenha invertido o texto, como se  lhe tivesse apetecido  saltar da cultura à contra-cultura. Era assim nos anos 60. Saltar da fotografia ao negativo .

Porém, neste momento , em Portugal seria mais  aceitável, menos absurdo  para o público que a pobre senhora, a Ruth, se  tivesse decidido dedicar  à prostituição para sustentar a família do  seu marido Teddi. o que daria oportunidade a mostrar como a mulher é um ser solidário,  em tempos de crise....

Por alguma razão ele, Pinter  é um cultor do absurdo. Segundo  Esslin, 1961. o teatro do absurdo  esforça-se por expressar o sentido do sem sentido, escola  em que se insere Pinter, como sabemos.

E que bem conseguido foi!

 A teatralizarão do absurdo é algo que faz bem a todos. Disso não temos dúvida.

Mas para celebrar Abril parecer-me-ia dispensável somar mais absurdo ao absurdo.

Pinter foi prémio nobel da literatura em 2005. Mas porque não um autor nacional?




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