terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Joy ganhará um Oscar?

Joy: um nome de sucesso 




Joy Movie Review, no spoilers – well, maybe some.Bradley Cooper quer ser Lance ArmstrongIsabella RosselliniDescription Robert De Niro Shankbone 2010 NYC.jpg


1-O filme de David Russel é uma comédia dramática  biográfica, lançado nos EUA em Dezembro de 2015 (filmes anteriores  The Fighter, 2010,  Silver Linings  Playbook (2012) e American  Hustle , 2013)

 Joy (Jennifer Lawrence ) é  a ex de um ex (Edgar Ramirez ) que partilha a cave da casa com o  pai  dela   ( Robert de Niro) 

Toda a família de Joy  vive na mesma casa:  a mãe    passa o seu tempo  deitada a ver novelas, a televisão assume a centralidade da sua vida (" pobreza"? tédio?...)


 Mimi a avó de Joy, que sendo a mais velha do grupo é a personalidade mais estimulante,  os filhos  dela, a irmã , etc todos moram  na casa.

Mesmo a  namorada do pai (Isabella  Rossellini)  uma viúva rica, cujo dinheiro servirá para financiar  o projecto de Joy - capital financeiro  para criar  produzir , distribuir   e vender a nova esfregona  para a limpeza  dos lares americanos- vive com o grupo familiar  as questões mais importantes, como a vida de Joy.

A casa é grande, a família também, mas apesar de tudo não me pareceu disfuncional, caótica é certo, mas solidária , bizarra nesta opção  (?) da partilha do espaço, talvez  o baixo rendimento  tal o explique, embora o pai pareça ter uma razoável situação..

O destino de Joy será partilhado pelo grupo,  tal como a casa.


2- A televisão, como instituição social, acaba por ser   uma espécie de cimento - discreto, fraco. anêmico - aglutinador  funcional  da história, atividade   trazida  à cena por Bradley Cooper, simpático e cheio de glamour, como sempre

Porém, o verdadeiro agente desta história  é  (o pequeno, no caso ) " capitalismo americano", a que Joy empresta  a cara, a que se junta  a  tal  televisão, uma parceria muito frutuosa.

Como princípio, a televisão  é  um catalisador  na expansão  do sistema, através  da publicidade e dos processos de identificação que gera na vida econômica dos produtos.

 O filme relata esta realidade, de forma bastante insípida, diga-se!

 Já  a história   parece queixar-se, com alguma razão, dos advogados, seres  diabólicos,  que  fazem a vida negra a Joy, o que também é  um lugar comum, no tratamento popular da figura, de advogado.

Joy é simpática aos nossos olhos  porque representa o trabalho e as suas dores, socialmente falando, como elemento  do sistema  É um  drama o cair no desemprego sem poder sair dessa situação de forma aceitável,drama   compreensível  a todos e talvez vivido, por cada um, alguma vez nas suas vidas.

Joy  é, por um lado, o elo mais fraco , corporiza o drama social dos trabalhadores e dos micro capitalistas,  em que  se tornou, mas, também é o elo   mais forte, na história, pois   é o pilar  da excêntrica e (falida?)  família.

É esta tensão  acumulada que dá força à personagem central, Joy   é uma vítima santificada, afinal !

Digamos, porém que este cliché, vítima santificada, é excessivo e quase afunda o filme.

3- Depois do seu sucesso pessoal chegar, vende imensas esfregonas,  transforma-se,  ela própria, num elemento salvador para as outras mulheres populares , ajudando-as  de uma forma piedosa a sair da pobreza, do desemprego.

Ela agora conhece as manhas do capitalismo. e ensina-as.

O filme tem demasiados ingredientes, como a casa tem demasiadas pessoas!

Jennifer Lawrence é uma mulher muito bonita , porém demasiado jovem para o papel de Joy , ganhará o Oscar pela sua beleza natural, digo eu.

Russel aposta na notoriedade de De Niro e Bradley Cooper, personagens laterais, mas não chega  para termos um filme. 

O filme  tem elementos a mais  que se anunciam para logo se desvanecerem  .

Não chega sequer a haver um   verdadeiro filme mas "acontece" um catálogo de temas !!!










domingo, 3 de janeiro de 2016

Timbuktu (2014)





I-De que fala Sissako, em Timbuktu?

Uma estética avassaladora:



Em território ocupado pelo radicalismo religioso, fala Sissako, aparentemente, da violência da ideologia totalitária exercida em nome da  religião, sobre a aldeia.

Aqui Deus chama-se ALÁ e os seus guerreiros são um terror para os aldeões.


Na verdade e mais profundamente, fala da injustiça na sua dimensão terrena e divina, sendo os "soldados" um mero instrumento da sua demonstração e o tribunal da aldeia também. ambos igualmente maus , perniciosos e profanos.



Fala mais propriamente, da quebra  de contrato entre

 os Homens 


( ou homens, vá-se lá saber se a letra  deve  ser maiúscula!)  
     

 e

 o Deus,  que aqueles prometem   amar  infinitamente- cada frase dos aldeões é sempre seguida ou antecedida de  : seja feita a Sua Vontade-

Em troca, esperam. apenas ( em vão)   não ser castigados  injustamente 

Mas Deus não cumpre, pelo menos o Deus dos aldeões   a quem destina  o terror dos soldados e a maldade dos juízes ( tribunal)


A grande perda sentida no filme é a perda da esperança  na  Justiça que é divina por definição  mas precisa dos homens da aldeia ( o tribunal dos aldeões é tão tosco quanto cruel)   para se  mostrar, (senão ficaria, para sempre presa ao  Cogito)


Que seria de Deus sem o concurso dos homens, nesta lide da (in)justiça? 


Este filme é , pois, sobre a (in)justiça na sua dupla vertente divina  e humana e sobre a maldade  revelada dos homens.



II-O  povo em causa  é  constituído por uma tribo nômada do norte de África , a pastorícia é a sua  base de sustento.



  A civilização  " exportou"  para lá livros, telemóveis, e outros instrumentos que lhes são,  tão intensamente estranhos quanto entranhados.


Mas nem por isso os homens ( do poder) melhoram.




III-Por lá , há  a harmonia da Natureza ( divina!) apesar dos « soldados de negro»   e do tribunal, os homens e mulheres da aldeia  vivem  felizes , há muitos afetos  e é no giro  dos afetos  e dos dias  que vivem todos a ser felizes, a jogar à bola, a ouvir música , etc, a pastorear rebanhos, a amar os filhos e as filhas e as até a saborear a doce amizade dos   animais. 




Agora a parte negra:vivem cercados pelos " guerreiros do  deserto", pelo  o poder  das armas,   poder que abala,destrói , exclui a harmonia e  o verdadeiro poder , o  de Deus. 



 Os «guerreiros»  vestem  as fatiotas negras  habituais nestas andanças , metralhadoras topo de gama, jipes topo de gama,bandeiras topo de gama, negras esvoaçantes, no alinhamento estético do EI.



Não há, na aldeia, uma casa de Deus , para rezar, celebrar o culto, ou descansar; na aldeia é tudo muito pobre, sendo o tribunal a única casa da comunidade  e a prisão anexa, naturalmente,  



A única «habitação» estável, a merecer o nome, é  mesmo a prisão ( em cujos corredores funciona o tribunal)



IV-Agora a questão é ; qual é o crime, em julgamento?

Adultério ? Impossível , tal demonstraria que os homens seriam maus ; seria esse o plano de Deus, para os homens bons , como os da aldeia? Parece-nos que não.


Adultério só nas hostes dos « guerreiros do deserto»  que um deles  mostra-se bastante interessado  numa  esposa da aldeia , sem sucesso 



Se o leitor quiser saber qual é o crime, em concreto, terá de  ver o  filme , o que se aconselha.


Adianta-se que é um homicídio de um aldeão contra outro.


Mais não se pode dizer.

Aconselhável a estudantes de Direito e de Antropologia e ao Bom Gosto, em geral

Oiça o maravilhoso fundo musical



e a entrevista







sexta-feira, 3 de abril de 2015

Cinderela

Cinderela, ou « um curso infantil para o Casamento»


1-«Sê  bondosa e corajosa.... » é o conselho da mãe de Cinderela (Cindi) imediatamente antes de morrer.

Na sua orfandade súbita, Cinderela fica cheia de lágrimas .

 No seu choro  é acompanhada silenciosamente pelas crianças que enchem a sala.

Conselho de Mãe  já é uma coisa séria, mas se for dado antes desta morrer,caso de Cinderela, passa a ameaça " Se não fores bondosa e corajosa. vais  ver, Cindi!!!!!!!!!!!!!!!!!..."

(As coisas, ainda pioram, se a Mãe é ,se torna, um fantasma que vai deambular.) 

Sentem-se as alminhas infantis,espectadoras, na sala, a tremer.

2-Será que  este caminho , o da bondade e da coragem,  trás algum benefício, a Cindi?

Sim, claro que sim, trás-lhe , a  longo prazo, com a ajuda dos milagres da Fada Madrinha,ela própria  corajosa, em substituição da sua falecida mãe , um bom casamento, mesmo o melhor do reino.


 O melhor casamento do mundo, com o Príncipe que é  o homem mais bonito do mundo, mais poderoso do mundo, mais rico do mundo, mais apaixonado do mundo, por ela, mais, mais....do mundo.

Mas , no curto prazo, nos anos de juventude e crescimento, estes ideais, coragem e bondade, de nada lhe servem e só a bondade da Magia,da Fada, a salvam da triste condição em que caiu.

Pensem nisto, crianças !


3-A Madrasta, que  aparece na vida de Cindi depois da morte da mãe, é má e cobarde e ensina as filhas   a explorar o trabalho de Cinderela, a roubar-lhe o quarto e expulsá-la para o sótão.

Esta segunda "Mãe" é o negativo da primeira:Cindi   passará  de aristocrata a criada da mansão.

Depois da morte do pai, quase logo a seguir à da mãe, Cindi  atingirá  a orfandade total.

 Cindi, nesta condição, é  esmagada pela maldade e pela cobardia das outras mulheres da casa.

Cindi só não morre porque vive nas nuvens, a cantar aos  passarinhos, na janela do sotão!

É mesmo este trilho sonoro que o príncipe segue para encontrar Cindi.

4- Há   malefícios (ou benefícios) da prática da  Maldade e da Cobardia?

Em primeiro lugar, as filhas da Madrasta não se casam com o tal de  Príncipe, o Bem Supremo o  que só  poderia acontecer  a uma das  três rapariguinhas em causa.

 O Príncipe é o prémio do jogo.

Logo, elas, filhas da Madrastra, perdem o jogo pois falta-lhes a protecção da Fada, uma segunda Mãe , bondosa e caridosa.


5-A natureza, os réis e deus (es)

Cindi que se tornara uma rapariga pobre e desprezada sai dessa condição, consegue o verdadeiro amor, a verdadeira riqueza.


A Fada Madrinha tem o condão de ter uma varinha,  pauzinho   que convoca fantasias que se transformam em realidades e vice-versa.

O príncipe  tem o bastão ( esqueça Freud) espécie terrena da varinha, símbolo do poder   . 


Cindi passa a ter à sua disposição a  abóbora  (carruagem) o  sapato de cristal , pequenos répteis   ( cocheiros) toda a NATUREZA se transforma ... a favor dela...

....  para tornar possível o amor, o  casamento, a riqueza.


A natureza, os réis e deus (es) afinal, são bons e corajosos.

















segunda-feira, 30 de março de 2015

Pirandello no TNDMII

Pirandello ,1867-1936




«Ele foi Mattia Pascal» ou  « O Falecido Mattia Pascal»  e  agora  o equivalente «O falecido Albano Jerónimo» no  D. Maria II.

 Albano Jerónimo está bem vivo e recomenda-se e ainda bem.

É um esquema  de títulos para atrair público.

Já quanto a Pirandello ... está irremediavelmente morto para todo o sempre. Pirandello andou vivo por aí, em Itália, onde teve uma biografia bem atormentada e sofrida, como nós.

A vida de Pirandello apanhou as duas últimas décadas do século XIX, pródigas em acontecimentos, mas em que a "preparação" da primeira Grande Guerra, 1914-1918, começara a delinear-se, a ganhar vida,a ganhar peso, guerra que viria a ser , só por si «O acontecimento do século XX» na Europa (devidamente acompanhada de sua irmã, a 2ª Guerra).

Acredita-se que a violência , a pré-guerra, digamos assim, seja um processo de construção lenta, por vezes pouco visível.

É, por isso, no  caldo cultural  do pré-fascismo italiano  que as escolhas sociais ( autoritarismo e morte) foram feitas e quando Pirandello nasceu para o mundo, pouco lhe restaria, senão aceitar , décadas mais tarde, o patrocínio  de Mussolini, ou apadrinhamento , se preferirmos esta palavra que o próprio viria a renegar.

É  já num ambiente de guerra  instalada que a  peça , ou o livro  em que  se inspira, nos vem  lembrar a verdade improvável, de  quão ténue é a fronteira entre a vida e a morte .

Na verdade,  a Pascal, ou Albano, tanto dá, é-lhe dado  desapropriar-se da   sua personalidade civil , do seu BI, descartando - o para   alguém que  estava morto numa perspectiva física , para  um cadáver qualquer sem identificação..

  Na ocasião , Pascal  aparta-se   da sua família e amigos, de cujo convívio se ausenta sem grande pena, com algum dinheiro no bolso ( melhor, na pasta) para sua alegria.

Mas ele há-de regressar deste óbito social  oportunista  e fingido.


Assim aconteceu, cenas volvidas, e na sua nova   encarnação civil, de novo, é   Pascal, ou Albano, a viver, vivinho.

Ou seja, voltamos à casa zero deste jogo.


No final, a peça , porém,  diz-nos mais qualquer coisa  , mais uma, essencial :

Se socialmente o "Outro" é uma construção nossa,do Eu, é verdade que  nós , melhor o EU, também é uma construção reflectida,  da autoria   social do "Outro", construção feita  tijolo a tijolo , todos os dias.

E no caso do livro de Pirandello a construção  do EU,  de Pascal , de Albano pelo "Outro", a família e amigos é feita até à última gota, um cálice de hipocrisia, duro de tragar , até à morte.

 Assim, a construção culminou em desconstrução, até ao fim dos tempos.

Como quase tudo!







sábado, 7 de março de 2015

"Mil vezes boa noite" de Erik Poppe



Erik Poppe dirige Juliette Binoche (Rebecca, a mulher) contra Nikolaj Coster Waldau (Marcus, o marido) lançando-os num vórtice, em que o centro das  rotações é dominado pelo amor recíproco e pelo desamor.

O amor está lá , como ponto de partida.

Mas de onde surge o ódio, a raiva ?

À semelhança de Poppe na vida real, Rebbeca é repórter  de guerra  na ficção , no filme.

 Rebecca é uma mulher  interiormente livre e usa o seu gosto pessoal pela liberdade a favor da criação artística,  em benefício das impressionantes fotografias de guerra que  faz, a favor das vítimas , seres  pobres, sem pátria ou religião real, fotografias que usa para denunciar as situações aí envolvidas.

No primeiro conflito de guerra , em Cabul, segue uma mulher bomba, uma mártir islâmica que acaba por se detonar num mercado, gerando uma cena de  grande horror.

Sendo a mulher um ser oprimido , mais nestas sociedades islâmicas que nas ocidentais cristãs ( talvez!) temos dificuldade em perceber como os homens, seus compatriotas, lhes  atribuem, este posto tão valorizado, de mártires...

Já dentro do seu casamento, o marido, Marcus, coloca-se na primeira linha  do seu repúdio, da mulher, atirando-a para fora de casa , como a um cão sarnoso, quando esta regressa ao lar vinda da Nigéria , de um campo de refugiados, por ter posto a sua, dela, segurança, incomensuravelmente, em risco....!!!

Na verdade, Marcus é  muito piedoso e expulsa-a pelos melhores motivos: não ver as filhas de ambos  a sofrer com a profissão de  alto risco da mãe, Rebeca.

Depois de perder a família, uma segunda guerra, como vimos, Rebeca acaba por se perder a si própria, por perder o seu ímpeto de liberdade, ao confrontar-se, de novo, em Cabul com uma nova mulher- criança, bomba.

Sem coragem para voltar a sofrer o mesmo horror é engolida sendo a sua alma arrastada, no ralo das perdas  imensas e reais da vida...

O corpo fica cá, cambaleante, de amargura, a sinalizar a maior das perdas, que é a de ficar vivo , em determinadas condições! 

É um filme que mostra que a fragilidade  desta mulher, como de muitas, é a sua força e vice-versa.

Uma agradável surpresa esta Rebeca!








domingo, 15 de fevereiro de 2015

" O sniper americano"

O "sniper americano" (Bradley Cooper) chamava-se Chris Kyle,   um lendário soldado americano , na guerra do Iraque , que  entre 1999 e 2009  provocou o maior número de baixas  no exército antangonista ( dado histórico)

O  real  C Kyle  foi assassinado por outro veterano de guerra, já em solo pátrio, depois de regressado da sua 4ª missão no Iraque.

 O julgamento do homicida prossegue, ainda  hoje , na terra que foi de ambos.

Será que Clint Eastwood , CE,  quis  celebrar o clássico  herói americano ?

Não: nem  o herói , nem o anti-herói , figura  que podia  estar  " em jogo". Nada disso.

O que  celebra , de forma subtil, é o facto  de as guerras nunca acabarem, mesmo depois de chegarem ao  seu "fim" oficial.

Já depois do regresso,  Kyle ( atenção que Cooper está  muito acima do peso para a personagem) passa a conviver  com a sua mulher, como "caçador versus caçado"  mesmo a nível afetivo e até sexual ( a arma de guerra é uma ferramenta que, de forma" brincalhona"usa para simular o seu papel de "caçador e macho" , a cabine de duche é usada como gruta- esconderijo no deserto, etc, etc)

É , exatamente neste ambiente conjugal que o ambiente bélico prossegue , curiosamente sem qualquer belicismo.

 Aqui CE  mostra a sua mestria.

Kyle  , no final é assassinado por outro veterano em stress de guerra, como ele próprio,aliás.

Não há uma 1ª guerra ou 2ª guerra , as guerras perpetuam-se , mesmo na "paz".

Esta lição  serve à Europa , serve à Ucrânia : as guerras nunca chegam ao fim, acautelem-se Senhores.


sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

A teoria de Tudo, ou quase



A teoria de Tudo

Trata-se de um filme romântico (será?) que nos traz  a história de amor vivida entre Stephen  Hawking, abreviadamente,  SH  e Jane  a quem o livro " Breve Historia  do Tempo  " é dedicado

 SH é reconhecido internacionalmente como um dos génios do século xx.

 Vítima de  uma doença gravíssima que o deixou paralítico, sendo a sua voz só audível porque sintetizada por computador,  SH sobrevive , cheio de luz, até ao casamento! 


Escreveu , em nota de agradecimentos, ao seu livro "Breve História do Tempo, Do Big Bang aos Buracos Negros" "edição Gradiva, 1988, "Resolvi tentar escrever um livro popular sobre o espaço-tempo depois de ter proferido, em 1982 as conferências de Loeb, em Harvard"

O livro é acessível, é divulgação cientifica  feita pelo próprio cientista, SH, pelo que o esforço foi bem sucedido.Infelizmente  está esgotado há muitos anos e nem agora a Gradiva se comove para nova edição.

Quem julgar que vai  perceber o tema, no primeiro terço do filme ,  não se engane . 

A preocupação do realizador é mais centrada em tudo o que se não ligue à compreensão do tema.

Com efeito, a primeira parte do filme  é a história de amor em si,que está em foco, é  o desespero  dele, provocado pelo diagnóstico da doença gravíssima de que padece, de acordo com o guião escrito pela própria Jane.

Ela  é muito voluntariosa,  e atira-se para um casamento de onde acaba por sair, por via de outro amor , o que nem é invulgar.

O romantismo  depressa entra em crise no casamento, mas SH não será um homem só, pois a sua genialidade e alegria são uma torrente de afecto  pelo mundo, pelos homens e mulheres e pelo extra-mundo, o tal dos buracos negros.

Mas  trás o filme algo de novo, a não ser sabermos que tão trágica história, refiro-me à doença, aconteceu e acontece, ao génio  SH ?

A miséria  daquele destino versus a Grandiosidade do homem, daquele homem, em concreto.

 É neste contraste que joga a moralidade do filme, por outras palavras : aos olhos de Deus somos todos iguais , no balanço dos tempos ! 

Mas substancialmente , nada trás de novo, como história de amor não faz carreira!

Tal como " O jogo da imitação" é uma narrativa histórica, fechada   , em  que o espectador permanece gelado na sua cadeira, talvez com  a consciência  de que , na miséria somos todos iguais .

Está tudo muito longe do homem comum.

Nada se criou, nada se transformou , apenas se plagiou uma já trágica realidade.

Ficamos à espera da Arte , a 7ª !









terça-feira, 20 de janeiro de 2015

o jogo da imitação



 Prepare a seguinte receita para  um filme ;

- uma narrativa bem organizada, ou seja, com princípio, meio e fim ( aqui deve verter-se a história pessoal de Alan Turing (1912-1954) ilustre matemático , lógico, cripto analista, pioneiro da inteligência artificial e ciencia da computação,

-uma acção dramática que enfatiza a sua  dedicação á causa de salvar vidas, na 2º guerra mundial, o que consegue ao nível dos 14 milhões, ao descodificar as coordenadas dos ataques nazis.

-ele é  honesto, íntegro, insociável e homosexual

-Como é hábito os Estados são implacáveis a trucidar este tipo de pessoas, sendo este homem condenado à castração química e terapia hormonal feminina.

 - fora do filme :com 42 anos de idade suicída-se , comendo uma maçã envenenada.

Este filme não tem a centelha  do Birdman.

É a história de uma vítima, trágicamente engolida pela má sorte do seu tempo.Mas é um filme fechado, todos vão "ver" o mesmo filme.Não  há abertura para o espectador , participar , construir  sentidos , sentir-se desafiado e sobretudo identificar-se.

Estamos todos demasido longe das capacidades mentais de Turing e até da lógica punitiva do governo de S. Magestade.

Foi o brilho de uma obra de arte que faltou!




Birdman | Trailer Oficial Legendado HD | 2014



De  que estamos a falar quando falamos de  "man"  ? 

Do homem ou do pássaro?

 Da pessoa, ou da personagem,  o "bird" ?

Quem controla esta dupla , de um só corpo e duas almas , aquela  pessoa amarelecida pelo tempo, o   velho, o homem ou o fictício e exuberante pássaro , personagem que lhe cavalga os ombros ,  famosa nas redes sociais, no cinema dos mega - heróis, criatura  de respiração ofegante e voz rouca ?

O homem-pássaro  pode voltar à  sua raíz , ao homem simplesmente  e   ser, aí,  autor , encenador e ator  de uma peça  , sobre o amor, mais especificamente   com o título " De que estamos a falar quando falamos de amor" ?

Estas viagens dentro do Ego , são  dolorosas  como o filme bem o mostra.

Quem vai libertar quem ?

No fim do filme vai sobreviver o pássaro , ou a pessoa, a pessoa , de verdade,  com a sua biografia  real , os seus anseios, medos e frustrações ?

Este filme vai responder ás perguntas seriadas, adopta métodos da   sócio - análise , rigorosas e vigorosas ,  cirúrgicas, tem uma estética surpreendente  e um transbordante  jogo  de sombras e luz.  .

Merecia ganhar os óscares (todos!?) mas é  uma peça dificil, profunda e exigente, talvez más recomendações para o juri de Hollywood.

sábado, 10 de janeiro de 2015

Mommy,2014
Xavier Dolan, Canadá

1.-Na última cena do filme , o muito jovem Steven , exactamente 15 anos, liberta-se do colete de forças que lhe «vestiram» no manicómio e corre muito , foge , com uma energia avassaladora, para uma porta , a verdadeira saída para a verdadeira liberdade, como um pássaro  a quem foi prometido o céu....

Certamente que, neste momento, o próprio Rosseau , tremeu sob a terra que o sepultou, por ter encontrado a sua alma gémea, na galeria dos  vivos, a de Steven.

Ouvimos mesmo um grito « Vive la France!» ( Não é verdade! Estou a fantansiar!) .

Ironias à parte, sabemos que este último filme de Xavier Dolan, de 25 anos, em França, teve mais de 1 milhão de espectadores.É a liberdade que é celebrada neste filme, tema bem caro à cultura francesa.


2.-Steven é uma criança e na sua forma de existir, frenética-sofre de hiperactividade- para ele, todas as coisas são  lentas e densas,

desde o amor à musica, que ouve num volume «pouco civilizado»

 o amor pela mãe, para quem rouba uma pequena jóia , de quem está dependente financeira  e afectivamente,

 pela vizinha, professora, com quem estabelece uma excelente relação de amizade, camaradagem e  aprendizagem

3.-Por onde «parte» este mundo quase equilibrado de Steven ?

De uma forma  surpreendente  e dramaticamente  traiçoeira  é a mãe a  vilã que recorrendo a um esquema  simulado , manda internar o miúdo , recorrendo aos serviços   do hospital/reformatório, cujos seguranças o apanham desprevenido     perseguem e "arrumam" com uma taser .

Porquê, em nome de quê? O filme não diz. E é, psicanalíticamente falando,  sobre   esta  falta de resposta do filme   que, provavelmente, se ergue o abismo, na  relação real  do próprio Xavier Dolan com a sua mãe .

Só no fim do filme nos libertamos desta cena de terror quando Steven  galopa a fuga para a liberdade. 

A mãe é  a instituição familiar -o pai tinha morrido anos atrás - e que  como instituição  e até como pessoa frágil ,  passa ao ataque  ao miúdo, priva-o de tudo, do mundo, da liberdade,  em nome do amor maternal  ! 

Pior era impossível !




















sábado, 21 de junho de 2014

Qual deles é Albee?


Qual deles é Albee?


Albee, teatro nacional D. Maria II,«três mulheres altas»


FICHA ARTÍSTICA de Edward Albee tradução Marta Mendonça encenação Manuel Coelho cenografia F. Ribeiro figurinos Dino Alves desenho de luz José Carlos Nascimento música original José Salgueiro com Catarina Avelar, Inês Castelo-Branco, Paula Mora e José Neves assistência de encenação José Neves produção TNDM II


O drama:
Albee, ele próprio, como personagem entra em cena: olha para a mãe acabada de morrer (Catarina Avelar)  e fica  sentado no leito, mudo durante  toda a peça, de costas para nós.
Na mente do «autor – personagem» trespassa  a voz da mãe de Albee, num percurso recordatório: esta é a narrativa, onde cabem  as três personagens a mãe-velha , a mãe-madura e a jovem-mãe. Não é fácil.
Através  dele, do «autor-personagem»  « ouve-se»a voz  de cada uma das três.
Albee lembra a mãe, como mulher velha  e nós ouvimo-la a falar dos momentos felizes  da sua vida acabada, sobretudo dos infelizes, do sexo da sua vida, em que o seu  homem,o marido, é um Ser lá no fundo da realidade .

 Simbolicamente, o marido oferecer-lhe  uma jóia, uma pulseira pendurada  no  seu, o dele, órgão genital. Patético para ele e para o género masculino, em geral.

  Este acessório , a pulseira assume a centralidade da cena  que de potencialmente erótica passa  a ridícula.
A «outra mãe» , esta na maturidade dos  seus 52 anos, é irónica, troça das outras como como se nunca tivesse tido sonhos, contrastando com a mulher velha, já desligada do tempo mas sobretudo com a jovem, cheia   de sonhos,esta  um anjo diáfano e magro (Inês Castelo Branco) que deambula, vai deambulando….no palco.
As mulheres são na peça  a pátria  dos homens, seres estes sim, animados, voláteis, sem eira nem beira, segundo elas.
A peça acaba  como acaba irreversivelmente  a luz da vida , representada  no lustre a cair levemente sobre o chão do palco.

Neste momento, morrem as três mulheres que são afinal uma só, como sabemos.
A filosofia existencialista está bem simbolizada nesta luz cadente. A morte das mortes, sem mais nenhuma chance.

Parabéns a todos, especialmente a Manuel Coelho .

segunda-feira, 2 de junho de 2014

Costa versus Seguro


Crónica  de uma morte anunciada: em exibição nas salas e casas de Lisboa e arredores, leia-se mundo.

Talvez arrastado pela ditadura de Seguro , António Costa faz politica genuinamente.  na praça pública, lugar privilegiado para observação  antropológica que é o que eu estou a fazer, nunca luta política.

António Costa já é o secretário geral de um partido agonizante

A  sua declaração de disponibilidade  corresponde ao grito de guerra ancestral.

 As sociedades , os grupos organizam-se em torno de um Totem , nunca dois, que  se destroem reciprocamente como inevitabilidade.

Seguro furta-se á luta, com pretextos democráticos, e nesse acto já anuncia a sua morte, pois os grupos não alimentam cobardes, o que seria um fardo.

Só a palavra  substitui a espada nunca um pedaço de papel, a  que chamam estatutos.

Visivelmente histérico, Seguro executa um ritual fúnebre face  aos media e é esse produto tóxico  que irá provocar a agonia e a morte da casa hospedeira dos dois antagonistas.

 O Partido irá morrer , se nada fizerem sendo a sua população redistribuída, o que não é dramático, mas a natureza das coisas.

O pai fundador , Soares, luta ....veremos o que se vai passar, se salva  a sua cria!




A ditadura de Ozon

Jovem e Bela, ozoN


Pergunto-me se Ozon terá feito  uma boa  escolha ao atirar a jovem Isabel, de 17 anos , linda, para  o terreno  das sedutoras  híper -profissionais, onde as Evas  deste mundo cumprem a destinação   bíblica da  sedução, em troca de  algo, depois  de inventado o dinheiro, a  troco deste.

A jovem Isabel não necessita de dinheiro, é uma burguesa, estudante da Sorbonne, mas necessita, sim de afeto, pelo que vai procurá-lo na prostituição, diz Ozon, através da personagem.

Afeto, essa coisa que os mamíferos encontram naturalmente, na natureza e que o homem, essa divindade inteligente e civilizada tem dificuldade, tanta, em encontrar ou reconhecer, na sociedade.

A jovem neste seu percurso  encontra  três clientes , através de um site, dois homens bastante idosos(posto de outra forma velhos!)   um deles,  cardíaco morre durante a "entrega sexual" : é este, afinal,  o dador de afecto à jovem, segundo a mesma.

O outro,  espantado com a juventude e beleza  desta , profere um  aforismo que reflecte uma sabedoria ancestral  “ Uma vez p... sempre p...” resumindo a maldição  bíblica... que o filme relembra.

É o modelo judaico cristão . 

Alem destes dois clientes idosos, Isabel encontra  ainda, um  jovem maníaco que Ozon ridiculariza.

Curioso: a jovem agradece sempre delicadamente, no fim de cada encontro. Agradece o quê? 

A família

Nessa busca  de afecto Isabel  sai , irreversivelmente, da família que aliás despreza, sem que, em concreto, saibamos  porquê.

Olhando para a mãe vemos uma mulher muito frágil, ora distante, ora chorosa. Olhando para o pai biológico, não existe . É tudo.Temos um padrasto protocolar.

Afinal Ozon, que pensar?

Quais os erros e pecados, daquela  família ?

Durante todo o filme Isabel exibe  uma família normal ,não disfuncional : apesar de tudo, uma mãe   calma, um padrasto respeitador, um irmão mais novo  muito próximo dela.



O que  Ozon pretende com o filme ?
i)Perpetuar artisticamente, a maldição bíblica da mulher, a Eva do início dos tempos, a Eva que se envolveu sexualmente com a serpente,representante do demónio.
À mulher ele (Deus) disse, punindo-a :

 “Multiplicando , multiplicarei tuas tristezas e gemidos .Na tristeza darás à luz filhos e te converterás  para teu marido e ele te dominará.”

Duríssimas palavras a ecoar através dos séculos.

Existe, no filme a intenção  do reforço  da  fatalidade ?

Sim, está lá : a mulher é   a    impura ao nível do Ser,hipócrita. com hipótese de sair deste estado lamentável  apenas e ironicamente “pelo parecer” que o diga a mulher de César .

ii)Inclino-me para  a explicação  freudiana, no caso a interpretação  moderna da personagem (“A civilização e seus descontentamentos ” texto de 1930, tradução de 2005, Livro de bolso, Europa-América) que é a seguinte :

 A tese de Ozon teria sido  demonstrar   a «necessidade de punição» da jovem, desejada por ela própria, por sentir intenções «pecaminosas» em relação  ao mundo, punição, aliás,  conseguida, com êxito,pela  pobre Isabel, ao ser descoberta. 

Passe a ironia, com aqueles clientes,o resultado  punitivo estava assegurado, dizemos nós,sempre.

iii)a ditadura de Ozon

Curiosamente há uma uma   cena, onde a personagem Isabel se agiganta e  ganha  uma densidade quase insuportável: 

quando, depois de descoberta, fala mansamente, na sala  com o padrasto;

a mãe , de repente, entra sala e surpreende um gesto, um toque entre ambos: o terror da mãe instala-se e domina. 

Ali, sim está o diabo.

O filme  vale por esta cena. Um segundo de bom cinema, nesta catástrofe que é o filme que explora dogmas. 

Nesta cena,  Ozon  mostra que a sua normalidade  é incompatível com outras.

Talvez o filme seja apenas isto:uma forma de ditadura, sem  explicação.Um filme estatutariamente blindado.









sábado, 26 de abril de 2014

Aranofsky

NOÉ DE ARONOFSKY



Aprendi a admirar Aronofsky, particularmente depois do Cisne Negro  (EUA,2010) obra que mereceu injustamente, duros reparos dos críticos portugueses.

Sem ironia, considero Aronofsky um erudito, neste tempo hipermoderno.

Darren Aronofsky : constam do currículo deste realizador filmes notáveis , entre outros,  Requiem for a dream, 2000, The Wrestler, 2008, Black Swan, 2010,de que já falamos.

Fomos ver Noé, o último filme do autor, em exibição em Portugal.

Que dizer?

Na ficha técnica estão os atores, todos sem reprimenda Anthony Hopkins Emma WatsonJennifer Connelly Kevin DurandMadison Davenport Russell Crowe, este no papel de Noé.

O realizador   transmite uma enorme força  na ação da sua personagem  central   Noé, Russel   Crowe, personagem bíblica,  Antigo Testamento ,  Livro do Génesis, naturalmente  associado ao dilúvio, momento em que  as águas   vindas do céu  inundaram a Terra e Noé, que  a mando de Deus com a família, navegou na  arca para salvar os animais da extinção por afogamento e morrer, ele próprio e os seus,  nesta missão.

Podemos entender que Aronofsky alterou os dados da história narrada na bíblia, afastando-se da letra, introduzindo acontecimentos criados por si ,  que não foram narrados  por Deus, o verdadeiro autor?

Sobrepôs-se à letra dos acontecimentos, a Deus, imaginem, mas a questão que importa saber sobre o novo Noé de Aronofsky   é   :

Aronofsky transgride o sentido do Noé divino?

O que Aronofsky fez foi uma síntese dos três principais personagens  do Livro do Génesis,   entre:

i)             o  verdadeiro Noé, o da Bíblia, o do dilúvio, acontecimento   que visava  castigar e punir o homem, representante do   Mal ,  figurado na   serpente, o veículo  e em Caim, o fruto.

ii)            Abraão, o que ia matar seu filho a mando de Deus, mas que se absteve no ato, 
não  por determinação do Criador que disso se arrependeu.

Personagens à parte, Aronofsky   apresenta  o dilúvio-acontecimento como  ele é narrado na bíblia, o castigo  que se segue  temporalmente à expulsão  do homem do jardim do Éden .

Nesta essencialidade ele respeita o sentido bíblico. As causas do (s) castigo (s) são as já conhecidas : a centralidade do homem na trilogia do Mal.

Com efeito: 

i)

Caim representa o Mal, sucedendo no tempo á serpente, que afinal o gerou, ou pelo menos ajudou a gerar, seduzindo Eva, no Jardim do Éden, a primeira Maldade, o sexo, como estamos lembrados, imediatamente antecedida pelo pecado da desobediência, a Maldição primordial, completando-se a trilogia do Mal.

O Deus bíblico, o Criador do mundo, ter-se-á arrependido de o ter criado, tendo desistido do homem, sua criação de eleição, pois este não fez por merecer o seu Deus, obedecendo-Lhe.

Com efeito, a criatura, o homem matou o seu irmão,  o homem o Mal encarnado: o episódio de Caim é central e recorrente no filme e expressa a centralidade  do Castigo, na lógica  da criação.

O filme recria a história do Mal, convinha não esquecer, com fidelidade, com emoção e com um raro sentido do sagrado.

Com efeito, o filme convoca a história primeira (de Deus, portanto) do Castigo do  Mal, da Maldade e da Maldição, o que é obra, sem transgredir o sentido bíblico, o que seria um mal menor.

Assim, o dilúvio é  o Castigo, a morte coletiva já que a morte individual tinha sido sancionada por Deus, no momento da expulsão do Éden.

Lembremos a bíblia:

o homem desobedeceu por querer ser igual a Deus, por ter “comido” simbolicamente, o fruto da árvore do conhecimento, passando a distinguir o Bem do Mal, fruto que afinal não era uma maçã real, nem sexo real como o representa a cultura eclesiástica, a cultura popular e também Aronofsky, mas não o texto da bíblia se diretamente consultado o que eu aconselho.

O dilúvio é a história do Castigo de Deus, salvando Ele os animais inocentes e é também  isso que Aronofsky nos lembra neste filme genial mas inflacionado em temas, todos primeiros na história da construção do homem.

A "criação de Aronofsky"

No filme existe um episódio, de todo estranho à história do dilúvio e da arca de Noé, episódio de sabor abraâmico, digamos:

ii)Tal como o Abraão bíblico, que  vai matar o filho a mando de Deus, como sinónimo de fé absoluta, o Noé  fílmico irá matar as netas  a mando indirecto de Deus, como prova sua fé e obediência absolutas, na missão de extinguir o homem e salvar os animais.

Horror, digo eu.

 No filme, Noé pára a execução porque se emociona ao sentir amor pelas netas, as duas fêmeas humanas que faltam à futura reprodução do homem, da humanidade.

Ou seja, Aranofsky inverte a hierarquia da Bondade,a outra face da Maldade, o homem é melhor que Deus-

Isto sim é revolucionário  no domínio da História Primeira.


Será    esta a razão porque o filme foi proibido nos países árabes?

Trata-se de um momento muito mobilizador da atenção e emoção dos espectadores, interessante sob o ponto de vista da intensidade dramática: na sala do cinema instalou-se um silêncio profundo e gelado, tendo todos os mastigadores de pipocas cessado a sua ação ruminante.

Se esta não é a prova da existência de Deus é, certamente, a prova da existência de Aronofsky.

terça-feira, 8 de abril de 2014

“O regresso a casa” Harold Pinter, no D Maria II

“O regresso a casa” Harold Pinter, no D Maria II

A acção inicia-se com o regresso a casa de Teddi (Ruben Gomes)   em visita aos  dois irmãos e  ao pai Max, pensionista pobre    (João Perry) visita de apresentação da sua mulher Ruth , mãe dos seus três filhos.

Até aqui temos a banalidade.


O irmão  de Teddi, Joey é um  pugilista modesto ( João Mamede) o outro irmão é agenciador de pequenos negócios, tais como a prostituição  de bairro.  O irmão de Max, o pai, é motorista de táxi  (Jorge Silva Melo) alminha que morre subitamente, sem provocar , tal facto, nenhum sentimento.

Aqui começa o distúrbio.

Se as personagens são  pobres em  recursos financeiros, já a casa  da família onde tudo se desenrola é indiferente, não é pobre, não é rica. Esta foi a escolha do encenador.

Tudo começa com um diálogo  infra- matinal, entre o pai Max e o filho agenciador, ambos sentados na sala, de manhã.

No diálogo não parece haver  intenção de agredir, nem do pai, nem do filho, mais parecendo  a conversa uma altercação  doméstica e pateta.

Joao Perry opta por um dicção arrastada, quase demente, entre-cortada por picos de voz  estremecida, emocionados , sem que o texto o justifique, picos muito rápidos, enfatizando, talvez, o absurdo que  adivinha.

Esta composição da personagem por Perry não nos parece feliz, já  que seria expectável alguma sacralidade dramática nos dizeres do pai, dono da casa, chefe do clã,  muito irritado com as ninharias matinais  do costume, mas mesmo assim o pai.

Elementos fora do ambiente:

Teddi faz a diferença, com o seu fato impecável e perfil  discreto, homem de poucas falas que  fala pouco, por sinal.

Ao despir e ao vestir o seu sobretudo branco de um comprimento e sumptuosidade notáveis, mais parecia  aquele sobretudo  um paramento.

Este filho Teddi, professor universitário nos EUA, doutorado em Filosofia, introduz o elemento de  diferença de classe social nesta família: a grande tensão, que se aproxima, fica assinalada.

 Porém, nenhum tema  da filosofia do dia a dia  é da  especialidade de Teddi, não respondendo, por isso ao irmão agenciador  de prostitutas, que formula perguntas muito bem estruturadas, todas sem resposta...

Será a mulher deste irmão Teddi que  resolve não partir com o marido para junto dos três filhos , nos EUA, ficando na casa da família, em Londres.

A mulher irá, pelo menos assim decide, depois da partida do marido, dedicar-se à prostituição, em benefício  da família do marido, pai e irmãos.

Este projecto surge do nada, na vida do casal visitante, mas no decurso da peça vamos perceber que não levanta qualquer tipo de conflito.

Na perspectiva da cultura ocidental tradicional, em que a pobre da Eva depois de seduzida pela serpente, se dedica, em exclusivo, a Adão  e aos benefícios do lar cristão, que corresponde à continuação do Jardim do Eden, esta  súbita e inesperada destinação de Ruth  ao Mal - saltamos do reino de Deus para o reino da serpente e do animais rastejantes -  escolha aparentemente desmotivada, deixa o espectador  incrédulo, o que ficou bem  expresso nos fracos aplausos, no D, Maria ll, espectadores  onde eu me incluía.

Sendo a peça de 1963, é de acreditar que Pinter tenha invertido o texto, como se  lhe tivesse apetecido  saltar da cultura à contra-cultura. Era assim nos anos 60. Saltar da fotografia ao negativo .

Porém, neste momento , em Portugal seria mais  aceitável, menos absurdo  para o público que a pobre senhora, a Ruth, se  tivesse decidido dedicar  à prostituição para sustentar a família do  seu marido Teddi. o que daria oportunidade a mostrar como a mulher é um ser solidário,  em tempos de crise....

Por alguma razão ele, Pinter  é um cultor do absurdo. Segundo  Esslin, 1961. o teatro do absurdo  esforça-se por expressar o sentido do sem sentido, escola  em que se insere Pinter, como sabemos.

E que bem conseguido foi!

 A teatralizarão do absurdo é algo que faz bem a todos. Disso não temos dúvida.

Mas para celebrar Abril parecer-me-ia dispensável somar mais absurdo ao absurdo.

Pinter foi prémio nobel da literatura em 2005. Mas porque não um autor nacional?




quarta-feira, 2 de abril de 2014

Por um fio, uma nesga



É frágil, leve, sem consistência a  linha que separa a vida da morte.

Um raio, um carro desgovernado, um embate  e a luz apaga-se para sempre.

Esperamos ser , sempre, a unidade que se salva ...e lutamos para , ainda amanhã, ver o sol

Por um fio......